Entrevista Relâmpago:

palavras da autora

Nanna de Castro estréia hoje, quinta-feira, no Rio, no Espaço SESC, o texto A bala na agulha. A direção é de Otávio Martins, com os atores Denise Del Vecchio, Eduardo Semerjian e Alexandre Slaviero.

 

Mineira, radicada em São Paulo, formada em Psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais e em Artes Cênicas pela Fundação Clóvis Salgado, Nanna de Castro cursou a Oficina de Roteiristas da Globo. Como autora teatral, integra um momento novo da dramaturgia brasileira – o forte ressurgimento dos autores empreendedores, que lutam para ter as suas obras montadas.

 

Em uma definição rápida, pode-se dizer que a autora é uma mulher dinâmica, com ampla vivência do mercado cultural e da arte. Para atestar o fato, basta relacionar alguns itens de sua trajetória profissional. Ela trabalhou em publicidade, na criação de campanhas publicitárias e projetos de comunicação. Foi roteirista de vídeos institucionais e de treinamento e de programas de TV. Atuou como atriz em comerciais, programas humorísticos, cinema e teatro.

 

Em dramaturgia, assinou textos infantis e adultos – Vô Doidim e os Velhos Batutas (Prêmio Coca-Cola de Melhor Espetáculo Infantil/1999), Mundus Immundus (adulto), Eu Te Darei o Céu (adulto), O Menino que Virou História (infantil) e Planetinha Azul (infantil).

 

Em A bala na agulha, o tema forte é tanto o envelhecimento quanto o desafio da entrega a uma paixão da vida, no caso o teatro, um desenho de trama que lembra um tanto o universo sentimental de Azul resplendor, de Eduardo Adrianzén, visto recentemente no Rio.

 

Vale conversar com Nanna de Castro.


FOLIAS TEATRAIS: Qual a sua formação em dramaturgia? Como vê a sua dramaturgia na estante teatral brasileira?
 
NANNA: Minha formação é em teatro e psicologia mas escrevo desde os onze anos. Comecei com crônicas imitando os autores da coleção “Para Gostar de Ler”. Sempre, mesmo em minha carreira como publicitária, fui apaixonada por roteiros e histórias. Fiz vários cursos de roteiros para cinema e TV com grandes mestres e a proximidade dos amigos atores de teatro gerou o primeiro convite para escrever uma peça infantil, em 1999, que foi um sucesso de crítica e concorreu a nove categorias do prêmio Coca-Cola, incluindo “Melhor Texto”. Desde então não parei mais. Acho que a dramaturgia brasileira vem passando por uma fase promissora de novos autores mas acho que o teatro como um todo sofre com a decadência da palavra. Os espetáculos que são bem sucedidos do ponto de vista de patrocínio e produção são cada vez mais rasos enquanto carpintaria dramatúrgica, cada vez mais visuais em detrimento da palavra. É o que Vargas Llosa chama de Civilização do Espetáculo onde a reflexão perde cada vez mais espaço para o entretenimento. Acho triste.
 
FOLIAS TEATRAIS: Existe na sua obra alguma influência ou inspiração de outro autor?
 
NANNA: Meu prazer é escrever sobre as pelejas do meu tempo e das pessoas que amo. A ideia deste espetáculo nasceu quando estávamos em cartaz com outro texto meu chamado “Eu Te Darei o Céu” dirigido pelo carioca Luiz Antônio Rocha. A atriz principal da peça passava por enormes dificuldades para se manter no elenco e sustentar os dois filhos. Era um drama ao vivo. Olhei para os meus diversos amigos que dedicam-se com determinação e sacrifício ao teatro, principalmente aos mais velhos, e achei que devia a eles este texto. Comecei a escrever e parei no meio. Achei que estava pesado demais. Foi uma luta terminar. É uma ferida muito minha também. Mas sempre respeito o texto como ele vem. Felizmente, depois de pronto, mesmo colocando as coisas de uma forma limite, ele foi conquistando as pessoas.
 
FOLIAS TEATRAIS: De quando é o texto? O envelhecimento em teatro – ou em arte – é um problema brasileiro, de falta de tradição e de valor, para as instituições, ou é, a seu ver, um componente da sociedade contemporânea de consumo?
 
NANNA: Escrevi entre 2007 e 2009. Na pesquisa que fiz percebi que a discussão sobre a necessidade ou não do Teatro não é só nossa. Diante de tantas tecnologias novas da comunicação, o Teatro permanece como um campo menos prestigiado pelo público. Mas é óbvio que sofremos mais em um país onde há menos valorização da Cultura como um todo. O envelhecimento em qualquer ramo de atividade é cruel na sociedade de consumo, pois também somos consumidos por ela enquanto força, juventude, agilidade, capacidade de trabalhar mais. Mas a proposta do texto não é denegrir a modernidade, o novo. Há um duelo entre o contemporâneo voraz e consumista mas eficiente e o clássico profundo, obsoleto e abandonado. Nossa vontade é de provocar a reflexão de cada um sobre o que tem valor de fato.
 
FOLIAS TEATRAIS: Como o texto foi escolhido para a montagem?
 
NANNA: Felizmente todos os textos que escrevi antes deste foram encomendas de atores. Nunca tive um texto na gaveta. No caso de A Bala foi diferente: escrevi porque precisava muito e comecei a correr atrás de um produtor que me ajudasse a colocá-lo em cena. Consegui a parceria maravilhosa do Will Sampaio e também do Grupo Aché que nos patrocina e então fomos atrás do diretor que trouxe o resto da equipe. Acho que este é o papel do autor nos dias de hoje: sair da toca e correr atrás de realizar a peça. É o que pretendo fazer nos próximos trabalhos, daqui pra frente.
Obrigada!