Diário do Festival de Teatro de Curitiba 2014
Parte I
Curitiba, a cidade inefável. Talvez esta possa ser uma definição adequada para este centro urbano jovem, de 321 anos, comemorados neste fim de semana, iluminado pelo sol e por astros de variada grandeza em apresentações nos palcos da cidade. Foi um fim de semana agitado: Festival de Teatro, Gun and Roses e Roberto Carlos estiveram juntos em cena.
Sim, Curitiba é uma cidade especial: é uma cidade que olha o céu. Dizem que os telhados de vidro, outrora muito comuns nas construções e nas casas de família, estão em extinção. Mas a metáfora, que se faz realidade no Memorial da Cidade e em seu mais novo luxuoso shopping center, pode ser uma ferramenta útil para definir certa metafisica que impregna o cidadão daqui e leva a urbe delicada a contar com uma forte vocação cultural.
Assim, o 23º Festival de Curitiba, o maior festival do país dedicado ao teatro brasileiro, ganha os espaços urbanos revestido em uma elegante atmosfera de receptividade. A população demonstra afeto ao evento a todo momento, sente orgulho de contar com um evento deste porte em sua cidade e recebe com muita cordialidade os visitantes. Além do fluxo nacional – e internacional – de espectadores, existe uma inclinação local para reconhecer a cultura como parte essencial do perfil do cidadão.
Na festa de abertura, no dia 25 passado, ficou patente esta condição. Nas declarações das autoridades que presidiram a solenidade, houve tanto o reconhecimento do perfil especial da cidade, como a observação de que sim, o povo está certo – cultura é gênero de primeira necessidade da alma. Do Presidente da FUNARTE, Guti Fraga, ao Presidente da Fundação Cultural de Curitiba e Secretario Municipal de Cultura, Marcos Cordiolli, passando pelo Secretário Estadual de Cultura, Paulino Viappiana, pelos representantes dos principais patrocinadores (Renault, Itaú e Petrobras) e pelo diretor do Festival, Leandro Knopfholz foram ouvidas palavras inclinadas a preservar a forma iluminada de existência da cidade.
E a primeira semana de festival confirmou os discursos e a animação que envolveu a abertura do evento. A cidade parou para ver espetáculos de rua, peças experimentais, grandes textos do teatro universal, atores contemporâneos, teatro de grupo… e o que mais se possa desejar ter em cena. Um turbilhão de teatro, para todas as idades, gostos e inclinações existenciais.
Além da mostra principal, que será importante comentar ao menos em parte aqui no blog, um formato novo se anuncia para o festival. São, no Fringe, as Mostras Especiais, temáticas. Nesta edição, são onze: Mostra Coletivo de Pequenos Conteúdos, Mostra Ateliê de Histórias, Mostra Novos Repertórios, Mostra Baiana, Mostra SESI de Dramaturgia, Mostra Ave Lola, ES em Cena, Mostra Seu Nariz, MIS, Mostra Sonora em Cena, Mostra Ademar Guerra.
Assim, além dos espetáculos de projeção nacional e internacional que integram a mostra principal, há uma extensa escolha de linhas de trabalho à disposição do amante de teatro. Um fôlego que justifica reconhecer a cidade como centro de cultura expressivo, mesmo que o mercado de cultura curitibano ainda seja bastante irregular. A rigor, persiste em pauta a preparação do futuro, sob um tom muito favorável ao teatro.
Na festa de abertura, afinal, depois de o Presidente da Fundação Cultural de Curitiba anunciar em seu discurso a criação de uma modalidade de vale cultura, um fundo de apoio ao teatro para subsidiar ingressos, o Secretario de Cultura do Estado ressaltou a importância e a história do festival e destacou o fato de que, pela primeira vez, estavam reunidos no palco, na festa, os poderes municipal, estadual e federal, o que não é um fato para se desprezar.
O discurso poético apaixonado de boas vindas aos festivaleiros proferido pelo Presidente da FUNARTE, Guti Frga, assim, foi um excelente indicador. Para uma cidade em que a cultura já existe como valor importante, reconhecer a dimensão preciosa do festival é um grande passo. Como os telhados de vidro de outrora, ele pode ser uma ótima forma para perceber a luz essencial à vida humana. E resta à delicada cidade do sul agradecer a presença desta vidraça nova, de agora, capaz de propor caminhos poéticos para os seres humanos. ∗
Créditos das fotos: Daniel Sorrentino e Ernesto Vasconcellos
Tagged: Curitiba, Festival de Curitiba, Fringe