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Festa de Teatro Tropical

 
Uma força une, sob laço estreito, oito países do mundo: o português. E um encontro artístico, o FESTLIP, sediado no Rio, promove a identidade do conjunto. Em sua nona edição, o festival este ano faz um verdadeiro turbilhão na história, muda coordenadas canônicas da arte do teatro, instaura novos processos de relacionamento internacional em arte e anuncia a possibilidade de se tornar um evento mais amplo, itinerante.Imperdível!

 

O centro da edição deste ano, que será encerrada neste domingo, é a montagem teatral do conto A terceira Margem do Rio, de Guimarães Rosa, dirigida por Paulo de Moraes. A encenação é de saída revolucionária por reunir oito atores dos oito países lusófonos, feito que se tornou possível graças aos ensaios realizados via internet. Foram 25 ensaios por meio digital e quatro presenciais. Com entrada grátis, as apresentações terminam neste domingo, na Casa de Cultura Laura Alvim.

 

Em janeiro, em Portugal, o festival terá continuidade. Numa coprodução com o Teatro da Garagem, será montada A Vida Como Ela É, de Nelson Rodrigues. Nada mal para uma edição cujo tema é a Conectividade e que contou, na abertura solene para convidados, na última quarta-feira, com a presença virtual, em telão, em tempo real, dos diretores José Mena Abrantes, de Angola, Gilberto Mendes, de Moçambique, e da atriz Maria João Vicente, do Teatro da Garagem, de Portugal. A transmissão do festival pela televisão, pelas emissoras TPA Angola e TV Gungu Moçambique, também surgiu como uma novidade da programação.

 

Ainda na cerimônia de abertura, o momento áureo de emoção lusófona aconteceu com a homenagem do ano, dedicada ao diretor, ator, intelectual e gestor cultural João Branco, fundador do Festival Mindelact, há 23 anos ativando a vida cultural de Mindelo, Cabo Verde. No seu discurso emocionante, João Branco surpreendeu a plateia ao exaltar o ser crioulo, uma acepção nova e positiva do substantivo que, no Brasil, num sentido antigo carregado de preconceito, gera polêmica e tem alcance controvertido.

 

A programação do festival apresentou ainda a peça portuguesa Solange – uma conversa de cabeleireiro, da Cia Nómada Art & Public Space, e a peça Kiwi, direção de Lucianno Maza. Completaram a grade uma mostra gourmet, oficinas, debate, exposição e festa-show.

 

A peça central da edição deste ano do FESTLIP, A Terceira Margem do Rio, impressiona o espectador teatral pelo encontro lusófono – ao lado da beleza da encenação, colorida em tons terrosos banhados por jogos sutis da luz, sustentada por uma bem urdida estrutura coral, extasia ouvir o belo texto brasileiro ecoar em diferentes sotaques.

 

A harmonia do trabalho de Paulo Moraes e Ricco Viana se impõe de saída, tem impacto muito forte, estruturante, e faz da peça um musical. Transpondo a trama literária para a cena, Paulo de Moraes escolheu a narratividade como chave da representação, um caminho hábil para contornar o pequeno número de ensaios. Ao mesmo tempo, ao tecer com Ricco Viana um desenho musical vivo, intenso, conseguiu meio eficiente para aumentar o jogo sentimental e afetivo, necessariamente esfriado pela narração. Nasceu assim uma dinâmica forte, envolvente, de alcance arrebatador.

 

O resultado é definitivamente lindo. Emoções surpreendentes despontam a todo momento, graças ao impacto das cenas – tanto a vibração geral, coletiva, do elenco, como a dança afro, de Suelma Mario, ou a representação da noiva sem pai, de Lisa Reis, fazem aflorar um sentimento denso de pertencimento, coletividade, vida comum que, habitualmente, não vivenciamos. O principal objetivo da mostra, ressaltar o fluxo que nos une a partir do verbo comum, é amplamente atingido.

 

Resta desejar vida longa ao FESTLIP. E ressaltar a grandeza das ideias e dos sentimentos que estruturam este evento tão raro, tão precioso, tão importante e tão complexo, concebido pela dinâmica mulher de teatro Tânia Pires, uma liderança cultural lúcida, preocupada em desenhar o futuro. Alguém que é capaz de batalhar para atiçar em nós a nossa apagada consciência de coletividade, os nossos elos de pertencimento, ressaltar o nosso ser lusófono, apontar para a necessidade aguda de encontros de identidade, merece todo o nosso apoio. E mais, merece o nosso mais profundo respeito.

 

Ficha Técnica
 

IX FESTLIP
CONCEPÇÃO: TALU PRODUÇÕES E MARKETING – Tânia Pires e Luciana Rodrigues
ESPETACULO: A TERCEIRA MARGEM DO RIO
DIREÇÃO: Paulo de Moraes
TEXTO: Guimarães Rosa
ELENCO: 08 (oito) atores, um de cada país da CPLP.
Leonardo Miranda – Brasil; Suelma Mario – Angola, Lisa Reis – Cabo Verde, Horácio Guiamba –Moçambique; Susana Vitorino – Portugal; William Ntchalá – Guiné Bissau; Rossana Prazeres – São Tomé e Príncipe e Carvarino Carvalho – Timor Leste
MUSICA: Ricco Viana
FIGURINO: Karol Lobato
ILUMINAÇÃO: Valmyr Ferreira
FOTO: Divulgação
PRODUÇÃO/IDEALIZAÇÃOTânia Pires E Luciana Rodriguez
REALIZAÇÃO: Talu Produções
DIVULGAÇÃO: Factoria Comunicação
TODA A PROGRAMAÇÃO TEM ENTRADA FRANCA –
Mais informações nos websites: www.festlip.comm
www.talu.com.br