Antígona: no coração da alma ocidental
Amor e razão, sangue e lei – os opostos cortam o corpo ocidental há séculos, como lanhos de estoques de míseros presidiários. Somos carne pulsante, mas raciocinante, prisioneiros sofridos de nossa capacidade de civilização. Nossos algozes, somos nós, vítimas de um eterno conflito.
Na tragédia grega, o conflito nascia do embate cego entre os deuses e os homens e do aparecimento da cidade-estado. A autoridade nascente, racional, despojou a família, renegou o poder da ordem patriarcal. Hoje, somos órfãos dos deuses e, ao menos em teoria, temos livre-arbítrio – permanece o dilaceramento, porém, ele nasce dramático, dentro de cada um, da oposição direta entre emoção e ordem.
Este é o eixo central de Antígona, cartaz em temporada curta no Poeirinha. Não perca por nada deste mundo! O velho texto apaixonante de Sófocles está repaginado, em sintonia com o mundo moderno, obra de Amir Haddad e Andrea Beltrão. O resultado é inebriante e lúcido, para manter o foco no jogo sugerido pelo debate teatral da montagem. Corra para ver.