O calor da arte do verão
Esqueça o calor do verão, até porque a chuva resolveu abençoar o janeiro do Rio: sim, a vida por aqui anda quente, fervendo. Mas ela está fervendo por razões alheias à natureza tropical. São os prêmios de teatro!
Na mesma semana, dois sucessos abalaram as temperaturas – a festa monumental do Prêmio Cesgranrio, no Copacabana Palace, e a divulgação dos finalistas do Prêmio APTR, cuja festa, com a aclamação dos vencedores, está cravada na agenda para o dia 22 de março, no Imperator, no Méier. É uma velha tradição da vida carioca reproduzida nos prêmios de teatro: o eixo Méier-Copacabana faz o Rio tremer…
E foi bem isto, a terra tremeu ali na Atlântica com Rodolfo Dantas, na segunda-feira. Uma nova era de amor ao teatro, glamour, louvor à arte se consolida com a festa de arromba do Prêmio Cesgranrio, em sua quarta edição, uma rotina desaparecida a partir do fim do velho Prêmio Molière, cujo charme já se tentou recuperar sem sucesso algumas vezes. Agora, a idade dourada voltou com força total. A torcida é para que a festa se torne uma instituição da cidade, abrigada com notável elegância no Golden Room do Copacabana Palace.
Pois é, foi tudo lindo. Desde a divertida cerimônia até a inspirada decoração dos ambientes, passando pelo bem servido bufê e pelo clima de encontro de classe dominante nos salões da festa, tudo funcionou em grau de excelência. Pairava no ar um calor especial, a comprovação de que o teatro é a arte da confraternização humana.
Todas as turmas estavam representadas. Estava lá o grande teatro, com estrelas da TV e monstros do palco, aqui e ali fervilhava o pessoal dos grupos, no flerte com os experimentais mais radicais e de papo com os produtores independentes. Todas as habilidades artísticas e técnicas circulavam nas rodinhas. Até mesmo a turma do sereno marcou presença na calçada, para disputar selfies, autógrafos e emoção, para surpresa dos eficientes porteiros do hotel, que não entendiam como todos souberam do enxame de estrelas na casa.
Para ser perfeita, a festa contou até com um belo atraso, por razões técnicas, prática carioca convencional. Na abertura, uma surpresa: a apresentadora, Claudia Raia, desaparecera, não era encontrada em lugar nenhum. O seu parceiro de cerimonial, o elegante Marcos Caruso, não hesitou nem um minuto para delatar a companheira, ao contrário da moda de boca chiusa que prevalece em algumas altas rodas do país. Anunciou em alto e bom som o sumiço da atriz.
De repente, a bela apareceu sussurrante no telão, pedindo socorro ao galã: teria sido sequestrada pelos jurados, ao tentar espionar os resultados do julgamento que fora realizado na sala secreta… Só então, quando a atriz foi resgatada pela equipe de apoio, os jurados puderam ir para o salão da festa. Posso garantir que foi tudo muito divertido, lá na sala do júri, onde eu estava. Pois, na verdade, os jurados é que estavam presos, na agradável companhia de Claudia Raia. Além de excelente atriz, rainha absoluta do musical brasileiro, ela é uma personalidade cativante.
Quando, enfim, todos se reuniram no Golden Room, espaço pequeno para a imensa plateia de convidados, que precisou ser distribuída por espaços vizinhos dotados de telão para a transmissão, a cerimônia de aclamação dos vencedores foi iniciada. Seguiu-se um ritual que tende a se tornar clássico. Para o anúncio de cada categoria, uma personalidade da arte era convocada e, após a apresentação da lista dos indicados, ela abria o envelope e proclamava o nome triunfante. Não faltou emoção. Foram muitas as belas palavras, os agradecimentos sinceros e comovidos, os olhares esfuziantes de felicidade, as declarações de amor.
A sequência da premiação foi interrompida em dois intervalos – o primeiro relembrou a importância dos artistas mortos ao longo do ano, desde a deslumbrante Maria Della Costa até a grandeza artística de Marília Pêra. O segundo trouxe à cena uma torrente de emoção histórica, com a aclamação da homenageada do ano, a notável atriz Nathália Timberg. Foi uma cerimônia intensa, coroada pela concessão à artista da Medalha do Mérito Cesgranrio, entregue por Carlos Alberto Serpa, presidente do Cesgranrio e idealizador do Prêmio.
Além do filme de homenagem à atriz, com dados de sua história, depoimentos e memórias, ela foi recebida no palco por uma celebridade muito especial, a artista responsável por sua estreia no palco brasileiro, em 1954, na Companhia Dramática Nacional: Bibi Ferreira. Nathália Timberg chegava então da França, onde estudou teatro, e, segundo a sua primeira diretora, arrebatou o coração de Bibi ao declarar que ela, Bibi, era uma atriz moderna.
O relato entra aqui com objetivo de deixar bem clara a significação histórica da noite. O resultado? Nathália Timberg, como boa parte da plateia, cedeu à emoção… Foi inesquecível. Choramos juntos. E aplaudimos, e rimos, a gritamos, e brindamos, e comemoramos.
Para ampliar a vertigem sentimental e a atmosfera calorosa, a abertura de duas novas casas de espetáculo foram anunciadas na noite, o Teatro Cesgranrio e o Teatro Nathália Timberg. Na crise teatral do Rio, em que faltam teatros e espaços culturais, a notícia ecoou retumbante. Portanto, a noite se transformou em muita História, revelou-se uma celebração do palco em todos os sentidos.
E teve mais: a festa, a própria festa fulgurante, com música elegante, gente feliz, conversas agradáveis, ditos espirituosos, figurinos surpreendentes. Varou pela noite de chuva, impregnada pelo calor da arte.
Segue abaixo o box dos vencedores. Outro post irá divulgar a lista dos indicados do Prêmio APTR. Para quê? Fácil deduzir: se o teatro brasileiro encanta o seu coração, corra para o Méier, teremos outra festa teatral trepidante. Para Copacabana, só há um jeito: espere o ano que vem, quando o verão da arte voltar!
FIGURINO: Carol Lobato, por Kiss me Kate, o Beijo da Megera
Apresentadora: Adriana Birolli
CENOGRAFIA: Bia Junqueira, por Meu Saba, Santa e Santa Joana dos Matadouros.
Apresentadora: Cris Vianna
ILUMINAÇAO: Aurélio Di Simoni, por Meu Saba
Apresentador: Thiago Lacerda
MELHOR ATOR: Bruce Gomlevsky, por Uma Ilíada
Apresentador: Ney Latorraca
MELHOR ATOR EM TEATRO MUSICAL: José Mayer, por Kiss me Kate, O Beijo da Megera
Apresentador: Francisco Cuoco
CATEGORIA ESPECIAL: Cláudio Lins, pela adaptação da obra de Nelson Rodrigues para o teatro musical
Apresentador: Ricardo Rossi
MELHOR ATRIZ: Ana Paulo Secco, por O Pena Carioca
Apresentadora: Zezé Polessa
MELHOR ATRIZ EM TEATRO MUSICAL: Alessandra Verney, por Kiss me Kate, O Beijo da Megera
Apresentadora: Danielle Winits
MELHOR TEXTO NACIONAL INÉDITO: Pedro Kosovski, por Caranguejo Overdrive
Apresentadora: Regina Duarte
MELHOR DIREÇAO: Marco André Nunes, por Caranguejo Overdrive
Apresentador: Marcelo Serrado
MELHOR DIREÇAO MUSICAL: Marcelo Alonso Neves, por Amargo Fruto – A vida de Billie Holiday
Apresentador: Marco Nanini
MELHOR ESPETÁCULO: Krum
Apresentadora: Bibi Ferreira
JURADOS: Carolina Virguez, Daniel Schenker, Jacqueline Laurence, Lionel Fisher, Macksen Luiz, Mirna Rubim e Tania Brandão.
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