Teatro negro, Rodrigo França e o BBB

“O teatro tem poderes, estranhos poderes. É inacreditável! Ainda agora mesmo, ele me obrigou a ver uma sequencia enorme do Big Brother Brasil, um programa que, para a minha personalidade, é invisível. Não, não estou fazendo julgamento moral ou intelectual. Bem sei que muita gente boa gosta e acompanha. Em contrapartida, muita gente boa defende a ideia de que o BBB é um evidente índice de atraso mental, um fruto estranho de um tempo em que a mercadoria saiu do espaço dos objetos e se tornou pessoa.

 

O BBB, para estes detratores do programa, seria a estupidez em estado puro. No meu caso, a questão é bem mais simples, o BBB me escapa, não consigo prestar atenção naquilo de jeito nenhum – portanto, difícil emitir julgamento ou opinião, sem ver a coisa em si. Para ser bem sincera, acho chatíssimo vigiar a vida alheia e a minha vocação para a fofoca é próxima do zero. Não rola.

 

Então, dirá o leitor atônito, como foi esta aproximação? Foi o teatro, já disse. Rodrigo França, em duas palavras. Aprendi a admirá-lo no palco, sobretudo em função de sua muito esclarecida luta a favor do movimento negro. Lúcido, estudioso, engajado, Rodrigo França consegue materializar em cena não apenas a emoção, a ação dramática, mas algo muito maior, quase impensável, o desenho analítico, intelectual, estruturador do humano muito humano, foco necessário para a definição cidadã em nosso tempo.

 

Sim, é claro que eu fiquei me perguntando que diabos este homem de luz, ativista teatral de primeira grandeza, foi fazer num programa em que o desejo dominante é vender pessoas vivas, em pedaços, como se fossem hóspedes de um zoológico? Para quem se esfalfa na luta para entender e definir as engrenagens sociais mais rudes, a escolha não seria um ato de adesão cega às trevas?

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