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O que é que eu faço com o meu voto?

Declare-se. Proclame. Discurse. Chegou a hora de abrir a boca.  Estamos a um passo da eleição. Você olha o mundo, fala e, com as suas palavras, tenta colaborar para botar ordem na aldeia. Vale a pena ousar pensar e ousar agir.

Com certeza, todos desejamos uma vida melhor. Neste caso, o desejo não é um voto pessoal, mas uma pulsação coletiva. Interessa para todos que a vida na sociedade aconteça num grau menos doloroso. E, portanto, há muito para fazer.

Se o Rio já foi liderança, não adianta chorar as glórias perdidas, está na hora de recuperar algo do ímpeto antigo, mas sob formas novas. Águas passadas não movem engenhos e, de resto, engenhos também são passado, só temos engenhos nos nomes de bairros. O fundamental é fazer as escolhas mais adequadas, com atenção à marcha atual do mundo.

O teatro, as artes –  a cultura em geral – não são itens secundários neste projeto. Muito ao contrário. Depois de perder tanto poder na esfera da economia, o que resta para a cidade é a possibilidade de fazer, da sua imensa criatividade, indústria. E não dá para entender como as prefeituras não têm investido todas as fichas aqui neste ramo.

Aliás, nem é ramo, é árvore. Ou mais: é uma imensa floresta. Existe uma tal diversificação na vida cultural carioca que as escolhas, para enumerar as artes, são bem difíceis, quando se deseja destacar algo.

 Impressiona constatar a dimensão da fortuna criativa – existe aqui uma efervescência de produção impressionante. O povo do Rio de Janeiro é um tesouro de arte. Não deveria, então, existir qualquer hesitação dos poderosos. A população não deveria ser abandonada ao relento.

Pois o que falta é, justamente, a ação do poder, interligando os pontos, acionando a projeção do que se faz, viabilizando as estruturas de produção. Um exemplo eloquente do estado de abandono e de desinteresse político nefasto?

O Rio lidera, no país, a inclusão do ensino de artes nas escolas públicas – em particular de artes cênicas. Talvez nenhuma outra cidade do país tenha iniciado mais cedo, e com a mesma rapidez e dimensão, a política de ensino de teatro – entre outras artes – nas escolas municipais. Mas…

As escolas e os professores agem na mais completa solidão. Quer dizer – o apoio institucional ou é mínimo ou é precário ou inexistente. Assim, a questão da formação artística do cidadão na Rede parece ser uma obsessão dos professores e de alguns outros seres solitários, dispostos a batalhar cada item básico essencial para esta prática. E a qualidade de produção alcançada já atinge um nível muito elevado.

O tema possui um interesse profundo para a vida teatral e cultural da cidade. Além do tema da cidadania, está em jogo a formação de plateia. Importa, portanto, que o poder tenha a visão política de agir neste campo, através de ações simples.

As ações mais importantes são bastante evidentes. De saída, está o cuidado urgente de equipar as escolas para o ensino de artes – as salas e as instalações adequadas faltam por toda a parte. Desta forma, seria possível desenhar uma rede teatral municipal escolar, uma rede apta para o intercâmbio de teatro escolar entre as unidades e para receber peças profissionais.

Uma outra medida de grande repercussão seria um projeto permanente de levar os professores ao teatro, como uma prática política de Estado. As peças poderiam se tornar escolhas também para os alunos. E as peças selecionadas deveriam contar com apoio para a produção de material didático específico. Também seria bastante oportuno instaurar  festivais e concursos de teatro escolar, com premiações de caráter formativo para os vencedores.

O Rio de Janeiro deveria manter acordos de intercâmbio cultural com cidades de projeção na área da cultura,  para as quais os jovens talentos cariocas pudessem ser enviados em viagens de estudo. Receber professores, artistas e jovens estrangeiros para residências de arte na cidade também seria uma medida de forte repercussão na dinâmica cultural da cidade.

Um outro tema mais trabalhoso, mas nada complexo, engloba a possibilidade de promover festivais de teatro e de artes cênicas. Tanto eventos temáticos como eventos amplos, abertos, deveriam acontecer como rotina no Rio. Um calendário de eventos permanentes definiria um fluxo cultural estável de grande valor estratégico.

Considerando o fato de que vários festivais existem pelo país, talvez fosse o caso da cena carioca investir a favor das vocações locais mais fortes – os grandes exemplos são a música, o carnaval, a festa de rua. Programar festivais tecendo teatro e estas formas privilegiadas da expressão carioca poderia ser a abertura de caminhos novos de afirmação da potência local.

Acontece agora em São Paulo um evento capaz de ilustrar este debate com muita eloquência. Trata-se da primeira edição, no Brasil, do Festival das Marias – Festival Internacional das Artes no Feminino. O festival começou no dia 5 de novembro e  vai se prolongar até o dia 25, com  formato online e todas as atividades gratuitas.

A identidade do evento não deixa qualquer dúvida a respeito de sua atualidade: o objetivo é o de se apresentar como palco do feminino. Assim, estão na pauta as discussões a respeito de temas pertinentes ao fazer artístico da mulher e criações femininas estão sob os holofotes.

As protagonistas são mulheres brasileiras. Integram a programação espetáculos e intervenções de música, circo, teatro, literatura, cinema e artes visuais, além de diálogos e oficinas. A partir do incentivo e da difusão do fazer feminino nas artes, o festival deseja provocar reflexões sobre o impacto das desigualdades na vida das mulheres.

A data escolhida para o encerramento, aliás, soa com muita eloquência. O dia 25 de novembro, é o Dia Internacional de Combate à Violência Contra a Mulher. Num país onde a violência contra a mulher persiste em alta, a iniciativa alcança um destaque muito importante.

A presença do teatro, dentre as diversas artes contempladas no festival, acontecerá graças a dois solos,  de Suia Legaspe (14/11, às 21h30) e de Annete Neiman (21/11, às 21h30). Haverá ainda um espetáculo infantil, VerDe Perto – o Musical Ecológico, com Renata Pizi (22/11, às 17h).

Importa frisar, para a avaliação objetiva da importância da proposta, que o Festival das Marias nasceu em Portugal em 2019. A sua concepção parte da ideia de cruzamento multidisciplinar e engloba, necessariamente, um carácter internacional, de articulação geral, no plano mais amplo possível, do debate a respeito da condição, hoje, da mulher.

Assim, a proposta está centrada na perspectiva da arte no feminino em várias áreas da criação artística. Pretende, naturalmente, se afirmar como resposta à perpetuação da desigualdade e da discriminação de gênero, ressaltar a vigência de oportunidades desiguais e a consequente disparidade de visibilidade de trabalho, entre homens e mulheres.

Ainda que a programação desta edição seja local, a temática do feminino e da criação no feminino está em foco, também, para reafirmar as relações entre países ibéricos e irmãos, buscando espaços para discussões comuns a todos os povos. Há um diálogo forte com Portugal e alguns pontos de interlocução com a realidade brasileira.

Qual a importância destes fatos para a avaliação da realidade carioca hoje? Aos poucos, São Paulo vem acionando em escala crescente esta chave importante de ativação da vida cultural, a realização de festivais. A atividade apresenta grandes vantagens para a indústria criativa, basicamente graças a dois fatores – a sua repercussão local imediata e a sua capacidade de articulação com o plano internacional.

Ao lado da possibilidade de estimular intensamente a realidade produtiva ao redor, já que várias esferas da vida social são acionadas, o festival funciona como um canal de sintonia com o mundo, para a renovação de ideias e de mentalidades.

A cena, portanto, não pode ser mais clara – existe um espaço amplo de diálogo devotado às condições da humanidade, no nosso tempo. Pensar o humano, através das práticas da cultura, é urgência mundial. Cada cidadão, neste jogo, se torna cidadão do mundo e precisa contribuir para que a sua aldeia consiga ser interligada, sintonize a dinâmica da aldeia global.

Tudo indica que o Rio de Janeiro, apesar de sua potencialidade enorme, está em descompasso com o andamento do debate. Caminhamos lépidos para nos tornarmos uma cidade muito hostil. Estamos afundando numa crise econômica e numa crise cultural inédita. Para superar o abismo, a cidade precisa de uma prefeitura e de uma ordem política municipal sensíveis às condições da crise e à partitura seguida nos tempos presentes.

Quer dizer, além da decadência e da crise violenta do Rio de Janeiro, específicas, clamando por saídas, há um chamado maior no ar, uma questão cultural global. Portanto, este chamado mundial aponta para o mesmo caminho, o único, que, na nossa ruína, restou para a cidade. Trata-se de uma dupla convocação: ela vem do mundo e da nossa própria miséria. A saída é a cultura.

Parte da decisão é de cada eleitor – importa reivindicar uma ordem edílica que seja um ato real de compreensão e de amor à cidade. Qual é o perfil do seu candidato? É este? Basta buscar tais qualidades e votar no ser que melhor as expresse. Enfim, o mote da semana aí está: mais do que nunca, cada um precisa saber muito bem o que fazer com o seu voto. Por amor ao Rio.

FICHA TÉCNICA

Festival das Marias – Festival Internacional das Artes no Feminino

(FOTO: Suia Legaspe, na peça O Nome das Coisas. Clic Beto Amorim.)

 Direção: Adriana Belic.

Consultoria: Bianchi Associados.

Gastronomia: DQF Gastronomia e Armazém Café Doceria. Curadoria de cinema: Pandora Filmes e Cine Petra Belas Artes.

Curadoria Entre Marias | Diálogos Musicais: Casa da Abelha Cultural.

Apoio institucional: Metrô SP.

Apoio cultural: Casa de Cultura do Parque.

Apoio: Câmara Municipal de Beja, Cidade de São Paulo, Governo de Portugal – DGArtes.

Média partners / Assessoria de imprensa: Verbena Comunicação e Platea Comunicação e Artes.

Realização: CADAC – Companhia Alentejana de Dança Contemporânea, Lendias d’Encantar e Belic Arte.Cultura.

Programação

Festival das Marias – Festival Internacional das Artes no Feminino

De 5 a 25 de novembro de 2020, a partir de São Paulo, Brasil

Canais de Transmissão:

https://www.facebook.com/marias.festival

https://www.instagram.com/marias.festival/

YouTube.com / Festival das Marias: https://cutt.ly/DgEqpbP

Cinema/presencial: Cine Petra Belas Artes(Rua da Consolação, 2423 – SP/SP).

Diálogos e oficinas: Verificar canal de transmissão ao vivo na programação.

Grátis.

ARTES VISUAIS

·         5/11 (às 17h) – Abertura exposição – Dani Sandrini

Título: Duas Cidades

Fotografias. Livre. Livre. Até 25/11. Visitação: YouTube.com / Festival das Marias.

·         7/11 (às 11h) – Abertura/exposição – Dan Agostini

Título: Hijras e Tiffanys

Fotografias. Livre. Até 25/11. YouTube.com / Festival das Marias.

·         14/11 (às 11h) – Abertura exposição – Dan Agostini

Título: Palomas / Retratos

Fotografias. Livre. Livre. Até 25/11. YouTube.com / Festival das Marias.

MÚSICA | SHOWS

·         13/11 (às 21h30) – Bruna Caram

Duração: 50 min. Livre

·         15/11 (às 19h) – Ana Sevá

Duração: 50 min. Livre.

·         18/11 (às 21h30) – Woman Summer Quartet

Duração: 50 min. Livre.

·         20/11 (às 21h30) – Consuelo de Paula

Duração: 50 min. Livre

·         22/11 (19h) – Bebé Salvego

Duração: 50 min. Livre

·         25/11 (21h30) – Fabiana Cozza

Duração: 50 min. Livre

TEATRO ADULTO

·         14/11 (às 21h30) – Espetáculo: O Nome das Coisas

Com Suia Legaspe. Duração: 60 min. Classificação: 14 anos.

Ficha técnica – Direção e dramaturgia: Henrique Zanoni -inspirado em contos, poemas e reflexes da poeta portuguesa Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004)

Intérprete: Suia Legaspe.

Cenário e figurinos: Carlos Colabone.

Iluminação: Aline Santini.

Produção: Edinho Rodrigues.

Preparação corporal e fotografia: Beto Amorim. Caracterização: Beto França.

Realização: Cia dos Infames / Cia Dramática em Exercício / Brancalyone Produções.

·         21/11 (às 21h30) – Espetáculo: Apenas Um Saxofone

Com Annete Neiman. Duração: 50 min. Classificação: 14 anos.

Ficha técnica – Texto: Lygia Fagundes Telles.

Interpretação: Annete Neiman

Foto: João Caldas Filho.

Arte gráfica: Clayton Santos Guimarães.

Produção: Teatro da Garagem Portugal e Teatro da Garagem Brasil.

TEATRO INFANTIL

·         22/11 (às 17h) – Espetáculo: VerDe Perto, o Musical Ecologico

Com Renata Pizi. Duração: 45 min. Livre.

Ficha técnica– Idealização: Renata Pizi.

Direção geral: André Auke.

Composições: Renata Pizi e Sonekka.

Poemas: André Auke.

Figurino: Horlando Baptistino.

Produção: Grupo 3 de Copas.

Coreografia: Rico Malta e Grupo.

Músicos: Renata Pizi, Everton Reis e Paulo Ribeiro.

Elenco: Renata Machado e Renata Pizi.

 Foto: Fatima Cabral.

CIRCO

·         14, 17, 19, 22 e 25/11 (18h) – Painé Santamaria

Mini espetáculo: A Louca das Frutas. Duração: 15 min. Livre. 

·         15, 18, 21 e 24/11 (18h) – Bárbara Francesquine

Mini espetáculo circense: Bambolês. Duração: 15 min. Livre. 

·         19/11 (21h30) – Troupe Guezá

Espetáculo: Elas por Ela. Duração: 45 min. Livre

LITERATURA

13, 16, 20, 23 e 25/11(18h) – Performance poética: 100 Anos de Clarice Lispector

Com Marina de la Riva. Duração: 15 min.

CINEMA

Cine Petra Belas Artes

Curadoria: Cine Petra Belas Artes. Únicas atividades presenciais do Festival das Marias.

End: Rua da Consolação, 2423 – São Paulo/SP. HORÁRIO A SER DEFINIDO.

·         25/11– Filme: Deus é Mulher e seu Nome é Petúnia

Macedônia. 2019. 100 min. Drama. Direção: Teona Strugar Mitevska. Elenco: Zorica Nusheva, Labina Mitevska e Stefan Vujisic.

25/11 – Filme: Papicha

Bélgica/França/Qatar/Argelia. 2019. 106 min. 16 anos. Direção: Mounia Meddour. Elenco: Lyna Khoudri, Shirine Boutella, Amira e Hilda Douaouda.

ENTRE MARIAS | DIÁLOGOS MUSICAIS

10 a 01/12. Terças, 17h – Música & Mel

·         10/11 – Michelle Serra (São Paulo, Brasil)

Tema: Produção cultural

·         17/11 – Luiza Morandini (São Paulo, Brasil)

Tema: Curadoria e programação musical

·         24/11- Luiza Mitteldorf (Berlin/Alemanha)

Tema: Consultoria de Negócios Musicais e Internacionalização

·         01/12 – Nefertith Andrade (Ceará, Brasil)

Tema: Produção cultural

OFICINAS

Canais de Transmissão:

Facebook e Instagram – @marias.festival

YouTube.com / Festival das Marias

Instagram das artistas