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Se você ainda acredita que foi Cabral quem inventou o Brasil, trate de se atualizar – vá até o Teatro João Caetano e veja Chatô e os Diários Associados – 100 Anos de Paixão. No palco mais simbólico do país, está em cena uma apresentação da vida e da obra de Assis Chateaubriand (1892-1968). A peça foi concebida pelo conglomerado Diários Associados para comemorar o centenário da instituição. 

A dramaturgia do espetáculo nasceu de uma parceria inédita, entre Fernando Morais e Eduardo Bakr. O livro escrito pelo primeiro, Chatô – O Rei do Brasil, ofereceu o argumento básico para a construção do texto. A estrutura concilia a narração dos fatos com cenas de ação, às vezes numa sequência rápida demais. As cenas musicais surgem quase como efeito decorativo – não integram a ação; a rigor, a peça poderia ser apresentada sem os números musicais.

Em cena, há uma trama bem-humorada que permite a narração da história de vida de Assis Chateaubriand, com ênfase na revolução que promoveu nos meios de comunicação do país. A história começa na atualidade, diante da estátua do célebre jornalista, no carnaval do Recife, quando Fabiano, o notável galã Claudio Lins, jornalista desempregado, é cooptado pelo biografado para conhecer a vida do louco criador da televisão brasileira.

Diante da plateia, a ação se desenrola em fluxo cronológico contínuo, mas com alguma mistura de passado e presente, às vezes provocada pelo inquieto galã. Afinal, convenhamos, um jovem jornalista da atualidade teria naturalmente sérios tropeços diante do precário mundo pré-digital. Para honrar uma cultuada tradição do gênero musical, o jornalista-narrador é envolvido numa insólita trama de amor. A parceria romântica com Juliana, defendida com brilhantismo por Patrícia França, tem química e é um dos pontos altos da montagem. 

O romance do jornalista permite desviar a atenção da vida amorosa de Chatô, assunto que renderia muitos descaminhos, e insistir na sua ação, a um só tempo desvairada e pioneira, na comunicação. Criador de jornais, criador de uma das rádios mais populares do país, ele desencadeou uma paixão nacional violenta ao criar a icônica revista O Cruzeiro. Líder autoritário, mas carismático, capaz de ouvir os colaboradores e mobilizar equipes de trabalho dedicadas, ele criou a radionovela e implantou a televisão a toque de caixa, no grito, sintonizado com a profunda inclinação nacional para o improviso, o uso de gambiarras. No caso, gambiarras milionárias. A televisão nasceu sem que existissem aparelhos de TV no país…

Para focalizar este emaranhado de ações de perfil tão diferenciado, que chega a incluir a criação do Museu de Arte de São Paulo (MASP), a direção de Tadeu Aguiar acertou ao dividir o palco em áreas distintas de representação. O conceito funciona com agilidade e beleza graças ao cenário engenhoso de Natália Lana – uma torre de letras que se espraia em cena, espécie de torre de babel passada a limpo. Afinal, Chatô foi um dos grandes arquitetos da integração nacional – a história da transmissão da inauguração de Brasília, com o uso de aviões para a emissão do sinal, concede eloquência a esta constatação.

O impacto da cena é ampliado pelos figurinos de época e pelo visagismo, com ligeiros toques caricatos, assinados por Dani Vidal e Ney Madeira, e Fernando Ocazione, respectivamente. A luz de Paulo Cesar Medeiros funciona como elemento contundente para criar os diferentes climas implícitos na ação, de emoção, recordação, situação e relato, e na gerência do espaço. 

Entregue a um elenco pontilhado por nomes experientes do musical, a montagem consegue revelar muito a respeito da obra e da personalidade do biografado. Stepan Nercessian impressiona com a sua habilidade para materializar o misto de simpatia e transgressão constitutivo de Chatô, sem abrir campo para uma avaliação negativa do herói-bandido. A sua escolha de gestos, o tom da fala, a malícia, a brejeirice e a franqueza desconcertante falam de uma interpretação construída com zelo, sem conduzir à composição mecânica.

Cláudio Lins consegue sustentar um trabalho de extrema complexidade, em que a função narrativa se associa ao interlocutor seduzido pelo líder e precisa ser combinada com a aura de herói romântico. A proposta, bem conduzida, oferece o desenho de um antagonista amigo, cujos contrapontos ao protagonista funcionam apenas para fazer a ação caminhar. Patrícia França se impõe em cena com desenvoltura nas funções um tanto esquemáticas de executiva e de mocinha romântica; o número sentimental de despedida é o seu ponto de arrebatamento do público.

Sylvia Massari diverte e extasia a plateia com uma secretária estridente, além de assinar um dos números musicais mais encantadores da noite – Hino ao Amor. José Mauro Brant, encarregado de diversos papéis, se destaca na exposição do dinamismo de Cassiano Gabus Mendes. A magia do canto de Ademilde Fonseca se instala em cena com Cristiana Pompeo e o carisma ingênuo de Hebe Camargo diverte muito com Fernanda Misallidis. Giselle Prattes ilumina a cena com a sua Carmen Miranda.

É peça de grande elenco, com atores absolutamente corretos nos seus desempenhos. Cada ator, fora do núcleo central, se ocupa de vários papéis. A extensão temática da peça, contudo, exigiu uma forma cênica preocupada em retratar uma quantidade enorme de fatos em múltiplos focos de ação. A situação limitou a expressão musical do espetáculo; como a presença da música não acontece como fator estruturante do texto, mas como acessório, o problema se torna muito perceptível na coreografia, de escala reduzida. Em geral, a marcação e a movimentação das cenas seguem mais a cartilha do teatro dramático convencional do que a do musical.  

Mas nada reduz o encanto central do espetáculo: a graça de ver o nascimento de muitas características do Brasil de hoje, em particular a mania de grandeza, a fanfarronice e o espírito inclinado para desafiar as leis fundamentais do bom senso. Caminhando contra o vento e contra a realidade, Chatô criou jornais, estações de rádio, revistas, a televisão, programas de rádio e de televisão. 

Quer dizer, inventou o Brasil real, não aquele das marchinhas, para o bem e para o mal. No centenário de sua atuação, neste país avesso ao culto da memória, importa olhar com atenção o que ele fez. Debater a sua obra. Portanto, corra para o Teatro João Caetano para ver a peça, em curta temporada. Talvez ela contribua com alguma coisa para uma visão mais nítida da nossa identidade. 

Ficha Técnica: 

Texto – Fernando Morais e Eduardo Bakr 

Direção – Tadeu Aguiar

Direção de Coreografia e Movimento – Carlinhos de Jesus

Supervisão Musical – Guto Graça Mello

Direção Musical – Thalyson Rodrigues

Arranjos Vocais e Instrumentais – Thalyson Rodrigues e Diógenes de Souza

Direção de Produção – Valéria Macedo

Produção – Naura Schneider

Iluminação – Paulo Cesar Medeiros

Design de Som – Gabriel D’Angelo

Cenografia – Natália Lana

Figurino – Dani Vidal e Ney Madeira

Visagismo – Fernando Ocazione

Cenotécnico – André Sales

Produção Executiva – Andrea Macedo e Keila Chimite

Marketing – Inova Brand

Assessoria de Imprensa – GPress Comunicação | Grazy Pisacane

Artes Gráficas e Redes Sociais – Alexandre Furtado

Realização – Voglia Produções 

Colaboração do Presidente do condomínio acionário dos Diários Associados, Josemar Resende 

Elenco: 

Stepan Nercessian 

Claudio Lins 

Sylvia Massari 

Patricia França 

 Anna Priscilla 

Caio Giovani 

Carol Futuro 

Cristiana Pompeo 

Fernanda Misailidis 

Flávio Moraes 

Giselle Prattes 

José Mauro Brant  

Marcelo Alvim 

Tati Cristine 

Thiago Marinho 

Thór Junior 

Thuca Soares 

Valentina Schmidt 

Músicos: 

Piano e Regência: Thalyson Rodrigues 

Violão, Cavaquinho e Guitarra Baiana: João Callado 

Clarinete, Sax e Flauta: Marco Moreira (Chiquinho) 

Trompete e Flugel: Nailson Simões 

Trombone: Leandro Dantas 

Baixo Elétrico/Acústico e Trompa: Diógenes de Souza Bateria e Percussão: Tiago Calderano 

Equipe Técnica: 

Assistente Direção – Erika Affonso 

Assistentes Coreografia – Carol Vilanova e Michelle Barreto 

Assistente Direção Musical e Pianista Ensaiadora – Gab Alkmin 

Assistente de Direção Musical e Preparadora Vocal – Anna Priscilla Lacerda 

Assistentes Cenário e Adereços – Alessandra Rodrigues e Mari Scott 

Assistentes Figurino – Bruna Nattrodt e Manu Lacerda 

Assistente de Produção – Raphaell Alonso 

Administração – Andréa Macedo 

Fotos Estúdio – André Wanderley 

Fotos Cena – Dalton Valério / Carlos Costa 

Vídeos – Dudu Chamon 

Técnico de Som – Vinícius Suzuki 

Técnico de P.A. – Paulo Altafim 

Microfonista – Michael de Alexandria 

Operador de Luz – Rodrigo Emanuel 

Canhoneiros – Jessica Barros e Ricardo Brito 

Chefe de Palco – Luis Mussum 

Contra-regras – Davi Pimentel Lopes e Carlos Elias 

Camareiros – Paty Ripoll e Marcelo Gomes 

SERVIÇO:

Local: Teatro João Caetano 

Prç. Tiradentes, s/n – Centro, Rio de Janeiro – RJ, 20060-070 

Temporada: 28 de março a 27 de abril 

Sessões: Sexta-feira às 19h | Sábados às 19h. A partir de 05/04 sessões extras às 15h | Domingo às 17h.  

*Quinta-feira: sessão extra (24/04) às 19h. 

*Sessões em Libras e audiodescrição dia 30/03 e todos os sábados às 16h. 

Valor: Plateia e Balcão Nobre: R$60,00 (inteira) e R$30,00 (meia entrada). Balcão Simples R$40,00 (inteira) e R$20,00 (meia entrada).   

Promoções: Ingresso Petrobras (patrocinador) no valor de R$30,00 para funcionários da Petrobras, mediante apresentação de crachá funcional, na compra de até dois ingressos, válido em toda temporada.  

Ingresso Cemig (patrocinador) no valor de R$30,00 para funcionários da Cemig. 

Ingresso Grupos no valor de R$20,00 para integrantes de grupos de formação de plateia, mediante lista entregue pela produção.  

Vendas:

https://funarj.eleventickets.com/#!/evento/a2be06bf2547fac07cf207be3636f48c67442f23

Duração: 2h20 – 15 minutos de intervalo 

Classificação Indicativa: 10 anos 

Duração: 2h20 – 15 minutos    de     intervalo

Classificação Indicativa: 10 anos